sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

"Desenha no céu... usa a ponta do dedo e desenha no céu..."

Sei que tenho uma dívida por ainda não ter dado continuidade às velhas sérias-séries, como a do meu TFG... mas confesso que nos últimos dias ando sem a menor inspiração para escrever pseudo-coisas-sérias... e como esse blog -às vezes- precisa de algum movimento, então vou contar uma histórinha curta e pessoal...
Quem acompanha o blog sabe que sou um adepto dos desenhos à mão livre como principal ferramenta no desenvolvimento de projetos arquitetônicos... hoje na minha mesa do escritório eu tenho um copo com um monte de lápis e um estilete para mante-los sempre apontados e é com eles que vou dos primeiros traços até os detalhes executivos dos meus projetos... claro que à lápis eu desenvolvo esboços e rascunhos que depois vão sendo lapidados com a precisão e com a facilidade que o computador proporciona... mas tudo nasce da ponta dos lápis que compro no Zaffari da esquina... 
Porém antes de eu receber o meu diploma eu fui desenhista de alguns arquitetos... pelo início dos anos 2000, nos últimos escritórios em que trabalhei, eu já usava basicamente o AutoCad... porém no meu primeiro estágio, no verão de 1998, eu era um desenhista old school: papel vegetal, prancheta inclinada com régua paralela, canetas nanquim Staedtler (estojo recarregável da 0,1 à 1,2)... normógrafo e aranha para desenhar as letras e os números, gilete para apagar os pequenos erros ou para corrigir com “bacalhaus” os erros maiores, fita mágica, esquadros, compasso, curva francesa e para finalizar, copos de cafezinho com solvente até a boca onde eu deixava as penas das canetas de um dia para o outro e assim evitava entupimentos... mas eu confesso, eu fui um péssimo desenhista... levava dias para terminar a planta baixa de um pavimento... minhas letras ficavam todas tortas... às vezes eu encostava a pena da caneta na borda do esquadro e fazia uma poça de nanquim na planta... enfim, eu era um desastre!!! MAS, tenho o maior orgulho em dizer que trabalhei à moda antiga.... 
E se a minha experiência com o nanquim veio em 1998, no inverno de 1997 eu já estava pelas salas de aula da FAU/PUC.RS e a minha lembrança mais remota é de uma aula do professor Paulo Regal... acho que era a primeira ou segunda semana de aula e o exercício que nos foi proposto era desenhar, à mão livre, linhas retas e paralelas entre si de extremidade à extremidade de folhas tamanho A3... primeiro no sentido menor da folha, depois no sentido maior... na diagonal... círculos concêntricos... de cabeça para baixo e assobiando... BAH... se teve algum dia que eu voltei para a casa pensando se eu deveria mesmo seguir na faculdade de Arquitetura, o dia foi esse... que horror... nenhuma das minhas linhas ao menos se parecia com o que deveria ser e paralelismo não era parte do meu vocabulário... ainda bem que o mestre Regal teve muita paciência e também mentiu bem o suficiente para fazer eu acreditar que eu tinha jeito para a coisa... 
Ainda mais remota que essa minha recordação das aulas de Expressão Gráfica na PUC é uma lembrança de uma tarde de calor no litoral gaúcho... meu avô estava tentando conversar com um velho amigo dele e eu, no alto dos meus 6 ou 7 anos de idade, estava honestamente tentando ter um pouco de atenção... e em determinado momento o dr. Jacob (meu avô) olha para mim e diz: 
- Alemãozinho, por que tu não desenha um pouco enquanto eu converso com o fulano?....  
- Vô, eu não tenho papel e nem caneta!!! 
- Desenha na areia...
- Não vô, na areia não gosto... (criança, às vezes, tem o dom da chatice)
- Então, alemãozinho, desenha no céu... usa a ponta do dedo e desenha no céu...
Meu avô não tinha a menor idéia, mas aqueles foram os meus primeiros desenhos de arquitetura... porque arquiteto não desenha na tela do computador ou em folhas de papel... arquiteto desenha no céu.
* Ilustrando a postagem algumas fotos que tirei por aí.
** Hoje, 24 de fevereiro, seria aniversário do dr. Jacob Lerner... uma pena que ele tenha ido sem saber que eu segui desenhando no céu, como ele me ensinou. Saudade vô.