sábado, 28 de julho de 2012

Mudando a paisagem...


Não lembro se já contei para vocês, mas meu pai é engenheiro civil. Formado há 45 anos pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Não escondo a grande admiração que tenho por ele, não apenas como profissional, pois além de ser um baita engenheiro o Gordo é um pai sensacional e uma pessoa incrível... e desde de criança eu ouço ele me citar um trecho da mais famosa música do Geraldo Vandré:

“...Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer...”
Há alguns anos atrás, um pouco desgostoso com a carreira de arquiteto-projetista eu sai da minha zona de conforto e deixei de esperar acontecer, me tornei um micro-incorporador e assim passei a ter controle sobre todo o processo. Comecei construindo um conjunto de quatro sobrados geminados em Caxias do Sul... destes eu passei à um segundo conjunto de casas geminadas, dessa vez três unidades triplex... hoje estou executando as obras de um pequeno edifício de apartamentos e já tenho na prancheta a minha próxima incorporação. 

Em todos os casos eu escolhi o terreno, fiz o estudo de viabilidade financeira, desenvolvi o projeto arquitetônico e parte dos projetos complementares, quantifiquei os materiais e fiz os orçamentos, contratei a mão de obra, executei a obra... e pra finalizar ainda fiz as vendas... devagarinho vou dominando a arte de bater o escanteio, correr para a área e cabecear... 
Eu não gosto muito de escrever sobre a minha produção, me sinto como aquele colega que escreveu o Guia de Arquitetura Contemporânea e incluiu mais de uma de suas próprias obras (de linguagem nada contemporânea)... mas sei que vários estudantes de arquitetura chegam até este blog e acho que compartilhar a minha experiência pode ser um jeito de mostrar que o arquiteto pode (e talvez deva) fazer a hora e ser protagonista na mudança da paisagem de nossas cidades.  
A minha primeira experiência eu relatei aqui: http://arquis.blogspot.com.br/2009/05/nao-eu-nao-morri.html e agora vou falar um pouco sobre a minha segunda experiência (ou seria experimentação?)... 

Enquanto eu tocava as obras das primeiras casas eu via logo cedo que os primeiros raios de sol iam direto à uma encosta não muito longe de onde eu estava construindo... uma das partes mais altas do bairro... terrenos com topografia difícil e super valorizados pelos privilegiados proprietários... 
Depois de um tempo de procura e negociações consegui um terreno com uma das melhores vistas e insolação... orientação leste-oeste, com aproximadamente 12 x 27, um desnível de 9 metros de frente à fundos e 2 metros de um lado ao outro... a condição para o proprietário do terreno negociá-lo é que mediante ao pagamento de uma diferença ele ficaria com um dos imóveis e este deveria ter dois dormitórios... 

Eu já havia definido que seguiria com casas geminadas, ainda estava embriagado pelas minhas recentes visitas aos novos bairros da periferia de Amsterdam onde os terrenos são super estreitos e mesmo assim aproveitados com uma arquitetura de primeiríssima linha... fora isso o meu capital de giro não permitia construções muito maiores (tenho orgulho de ter recebido, através meus pais, uma excelente educação e à partir dela ser um self made man)...
Pela largura do terreno o máximo que eu conseguiria seriam 3 unidades, uma já estava definida -seria de dois dormitórios- as outras duas eu defini que seriam de três dormitórios para assim maximizar o VGV (Valor Geral de Vendas)... com isso somei às condicionantes do terreno a busca por uma unidade arquitetônica mesmo com unidades de diferentes tamanhos.

Além disso o terreno tinha uma característica interessante, estava localizado em uma rua sem saída e devido à topografia a fachada dos fundos seria vista ad aeternum por quase todo o bairro... ou seja, a fachada dos fundos se tornaria a principal e as casas deveriam se abrir para ela para aproveitar a vista e o sol da manhã.
Para fechar com chave de ouro havia o condicionante mais duro de todos: resolver a equação custo x arquitetura... os detalhes que compõe a boa arquitetura nem sempre custam pouco e a obra em um terreno com topografia tão acidentada já não seria algo barato... e como eu não sou uma organização sem fins lucrativos eu deveria ter sempre em mente que LUCRO = PREÇO DE VENDA - CUSTO... o preço de venda é definido pelo mercado, logo o único elemento sobre o qual eu tenho controle é o custo.

O resultado foi uma planta de três pavimentos, na qual o nível inferior abriga a garagem, a área de churrasqueira, a lavanderia, um terraço que acessa o pátio e um lavabo; no nível térreo cozinha, sala de estar/jantar; no nível superior os dormitórios e os banheiros. Respeitando a topografia as casas foram escalonadas ao decorrer do terreno e há uma escada no fundo de cada uma delas que dá o acesso do nível inferior ao pátio.
A solução volumétrica é basicamente três volumes em balanço que estão emborcados em um volume principal... sobre este volume principal três reservatórios individuais, sob este volume principal uma base revestida com salpique, que remete à um acabamento típico da arquitetura vernacular da região. 

O resultado final me agradou bastante, claro que dentre as experiências tem aquelas que não serão repetidas, mas no geral esse projeto me parece um bom exemplo de como um arquiteto pode ser feliz por conta própria.
As fotos eu que tenho não são as melhores, várias delas são do período de obras e todas elas foram tiradas com o meu celular, mas assim que for possível providenciarei uma boa sessão fotográfica.