domingo, 15 de outubro de 2006

O cliente sabe o que quer?

No inicio deste ano (2006) eu passei por uma das situações que nas conversas de bar do tempo da faculdade eu mais temia, um amigo me visitou no ateliê para que eu lhe fizesse o projeto de uma nova pizzaria em Caxias do Sul, até ai tudo bem, o problema estava nas fotos e nas referências que este amigo me trouxe, é difícil de acreditar, mas havia imagens desde castelos até casas neo-vitorianas (existe isso?) e por mais que eu tentasse lhe convencer que aquele não era um bom caminho a ser seguido, que suas referências não eram boas e que eu não faria um projeto com aquelas bases, mais e-mails ele me enviava com novas idéias, nos mesmos moldes das anteriores, sempre justificando que a sua pizzaria já estava no mercado a mais de 20 anos e que não poderia ter nada que chocasse ou causasse estranheza aos seus clientes (como se um castelinho não causasse estranheza…).

Pois bem, comecei o projeto e captei que o que o cliente desejava não era a linguagem formal dos castelos ou das casas com torres e telhadinhos para neve, o que ele desejava era uma imagem de tradição. Uma imagem que representasse os mais de 20 anos de existência do seu restaurante tipicamente italiano. E com isso em mente comecei a fazer exatamente o que o cliente havia me solicitado, mas do meu jeito.

O resultado foi um projeto de linguagem contemporânea composto por três prismas retangulares de alturas diferentes, sendo o mais alto composto por dois pavimentos onde no térreo abriga as cozinhas e a copa; o mais baixo abrigando o salão principal e o de altura intermediária, um volume de madeira que abriga na sua parte frontal a sala de espera e recepção, no seu centro os sanitários e na sua parte anterior um pequeno salão para eventos que pode ficar interligado ao salão principal, ampliando a capacidade do restaurante para mais de 120 pessoas.

Em contraponto às linhas retas e formas puras da arquitetura contemporânea quase a totalidade dos materiais de construção empregados e de acabamento foram provenientes de demolições de velhas casas da região da serra gaúcha. Os tijolos, as madeiras, os barrotes de sustentação do telhado e as aberturas pivotantes foram todas reaproveitadas de velhas construções de arquitetura tradicional italiana, inclusive com a particularidade da porta de entrada principal e sua bandeira com vitral multicolorido serem da antiga casa dos pais do proprietário, onde o mesmo se criou.

Somado a isso a ambientação ficou a cargo do proprietário, que é um colecionador compulsivo de objetos de antiguidade, dos mais variados tipos, desde cartazes de propagandas antigos até lampiões e ferramentas quase seculares, objetos estes que tomaram conta do espaço interno da edificação criando um clima aconchegante e impar.

Moral da história, os clientes não sabem realmente o que eles querem e é função do arquiteto mostrar as possibilidades de um projeto e conduzi-lo da maneira mais adequada possível. Hoje meu cliente diz que ele nunca imaginou sua pizzaria assim, mas vendo ela pronta não faria de outra maneira.

Algumas vezes temos a oportunidade de intervir e abrir um leque maior de possibilidades que o cliente sequer imaginava e isso está na nossa função como arquiteto, é muito simples e cômodo colocar a culpa no cliente ou no mercado para isentar nossa incompetência profissional. Abaixo algumas imagens do que era para ser um castelinho.)



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