Auf Wiedersehn, Tempelhof.
Bem... seria. Mas o fechamento de Tempelhof teve um significado maior.
Definido por Lord Foster, autor de proeminentes projetos na área, como “a mãe de todos os aeroportos”, Tempelhof assombra pela sua monumentalidade. O prédio principal, que abriga desde o terminal de passageiros e áreas administrativas até hangares e áreas de manutenção, estende-se, em um imenso semicírculo, por mais de 1.200 metros, com altura de 6 andares. Figurou, durante muitos anos, entre os 20 maiores edifícios da terra. Junto ao pátio de aeronaves, há uma gigantesca cobertura em estrutura metálica, em balanço, sob a qual até mesmo jatos já modernos da década de 70 podiam estacionar, possibilitando o desembarque dos passageiros a salvo das intempéries, algo inédito até então. Hoje, quando muitos aeroportos possuem pontes de embarque, que levam o passageiro diretamente do terminal para dentro do avião, não parece algo relevante. Em 1941, acreditem: Era o último grito.
A impressionante cobertura em balanço: Um "must" em 1941
Ainda assim, em toda a sua monumentalidade, Tempelhof oferecia aos passageiros que por lá passavam um ambiente surpreendentemente intimista e aconchegante. O grande lobby do terminal, revestido em materiais requintados e com seu mobiliário um tanto racionalista, misturando aço e madeira, remete à era romântica da aviação, quando voar era privilégio de poucos, constituindo-se em um artigo de luxo.
O aconchegante terminal de passageiros
Tempelhof, como vocês já devem imaginar, fazia parte dos ambiciosos planos de Hitler. O prédio principal e algumas edificações vizinhas seriam uma espécie de “porta da Europa”, em sua mega-capital mundial, “Germania”. Albert Speer, arquiteto de Hitler, incumbiu o prof. Ernst Sagebiel (também responsável pelo projeto da suntuosa sede do Ministério dos Transportes Aéreos) de reformular o antigo aeroporto que ali existia, surgindo então uma das obras mais emblemáticas da arquitetura do III Reich.
Planta geral do edifício principal e outras edificações adjacentes: Parte do ambicioso plano do "führer".
Curiosamente, Tempelhof não teve uso militar intenso durante a II guerra mundial, a não ser em situações esporádicas. Mas, em suas instalações, foram montados bombardeiros “Stuka” e caças “Focke-Wulf”, com peças trazidas de várias partes da cidade através de uma engenhosa rede de túneis. Em 1945, no apagar das luzes do conflito, o aeroporto foi tomado por tropas russas, seguindo-se uma sangrenta batalha com a temida “Luftwaffe”, a força aérea alemã, durante a qual o comandante alemão que recebeu ordens para explodir o aeroporto preferiu tirar a própria vida a seguí-las. Os russos tentaram desocupar os cinco níveis inferiores (incluindo três subsolos) do prédio principal, mas as perdas já haviam sido grandes entre as tropas e os alemães haviam colocado minas por toda a parte. A solução dos russos foi inundar os níveis inferiores, condição em que se encontram os três subsolos até hoje, e assim devem permanecer, devido à grande quantidade de minas não detonadas.
Foi poucos anos mais tarde, em 1948, que Tempelhof protagonizou um dos episódios mais importantes de sua história. Alegando dificuldades técnicas, tropas russas controlando a alemanha oriental impediram todas as ligações terrestres com Berlim Ocidental, restando apenas as rotas aéreas que levavam a Tempelhof, então único aeroporto da cidade. Assim, nos próximos 11 meses, 2,5 milhões de berlinenses ocidentais dependeriam única e exclusivamente dos mantimentos que chegavam por Tempelhof, nas asas das forças aéreas das potências ocidentais. Um batalhão da força aérea americana chegou a ficar sediado lá durante este período para coordenar esta operação que praticamente garantiu a sobrevivência da cidade até 1949 quando acordos puseram fim ao bloqueio terrestre. A tensão entre o ocidente e os soviéticos só aumentaria nos anos seguintes, culminando com a construção do muro de Berlim, em 1961.
DC-3 da USAF descarregam mantimentos em Tempelhof, durante o bloqueio terrestre a Berlim Ocidental: Aeroporto garantiu a sobrevivência da cidade.
É em especial por este último episódio que a cidade de Berlim nutre sentimentos ambígüos em relação ao aeroporto de Tempelhof. Os alemães de um modo geral, têm um sentimento de culpa e rejeição a tudo que lembre o infeliz legado do país na II guerra, cuja intensidade é difícil para quem não é alemão entender. Mas pergunte a um berlinense idoso, que tenha crescido no lado ocidental, o que ele acha de Tempelhof. Freqüentemente, você ouvirá frases como “devemos nossa vida àquele aeroporto!” Por isso a perspectiva de fechamento (“demolição” não foi sequer mencionada) do aeroporto gerou uma grande comoção na cidade. Ainda assim, essa foi a decisão, e ainda permanece incerto o destino de suas instalações. Eu, como entusiasta da aviação, gostaria de ver um belo museu lá.
Conversando com um hamburguês, que também trabalha com aeroportos, e que me questionou por quê eu tinha uma bela foto de um DC-3 estacionado em Tempelhof como “wallpaper” no meu laptop, respondi-lhe que o aeroporto era histórico, por sua arquitetura e por sua importância para a cidade (sobre a qual fui procurar saber mais depois dessa conversa), e que era uma pena fechá-lo, o que eu já sabia que iria acontecer dentro de poucas semanas. Ele concordou, mas acrescentou: “Entretanto, crescemos com a culpa. Não sabemos se esse é exatamente o tipo de história que queremos preservar”.
Tchê, melhor post do ano... sensacional mesmo!!! Te confesso que nem sabia da existência deste gigante tão cheio de história...
ResponderExcluirE acho que não vão demolir ele, esse papo de demolir obras prontas é para país rico, como o Brasil...
abraço